SENHORA ROSEIRA
O chão onde te plantas, Senhora Roseira,
me agrada.
Tua raiz-matriz, Senhora Roseira,
me agrada.
Teu caule-madeira, Senhora Roseira,
me agrada.
Tua folha-outoneira, Senhora Roseira,
me agrada.
Teu espinho-garra, Senhora Roseira,
me agrada.
insolente,
com ar de quem usa o máximo da beleza,
acima de tudo perfumada... Senhora Roseira,
me assombra:
diz-me ela que nenhum homem é maior
do que a leve
queda
de uma pétala.
Fortaleza, 72
NOTA - Vertido para o francês pela Prof` Nilda Pessoa, para o livro Poésie du Brésil - Org. Locardes Sarmento - Paris, 97
UM HOMEM QUE DORME EM NEDERLAND
À Marianne Bruijins
Estou dormindo em Beatrixstraat, 18
Neuw Loosdrecht - Nederland.
Milhares de botas
de centenas de países
passam
por
cima
do
meu
sono
e reivindicam de mim a nacionalidade.
Gritam ate que eu acorde,
que sou brasileiro.
Mas eu continuo dormindo
(indiferente)
porque o homem que dorme
não tem nacionalidade.
E o meu sono pesado
na balança de São Miguel
tem o mesmo peso do sorriso,
do choro, da fome, da dor
e do amor
de todos os pés
que não passam por cima
do meu sono
e conduzem a fragilidade
da criança que sou
nos caminhos do Mundo.
Recife, janeiro 1972
CINCO CHAGAS
Cinco chagas prostram-te no chão
e teu espírito leve evaporou
porque da Paz o homem duvidou.
Que estrutura arcaica te gerou
que permitiu assim teu passamento
nessa Jerusalém feita a cimento?
É que rasgou, a voz da tua guitarra,
a farsa do poder que faz a guerra
sem plantar um só corpo sob a terra.
Calaram-te John (Emanuel) Lennon
mas teu silêncio, neste momento,
faz o mundo repleto de argumento.
Brasília-DF; 1980
STOP - PAROU A VIDA
Para Carlos Drummond de Andrade
Choro copiosamente por um homem
mas sei que é um choro cego, surdo e mudo,
e com os olhos secos.
Portanto, é um gesto camuflado:
nunca poderá ser visto,
como nunca se vê nada
por dentro de um homem.
Todas as palavras
que possa dizer para ele
ou sobre ele
serão engolidas pela morte.
Não manifesto qualquer reação,
porque, semelhante a este homem,
mas de esquife infinitamente menor,
estou estático, como um carro velho,
e sou igualmente inútil
perante a vida.
Brasília-DF, 1987
INFÂNCIA RETIDA
Para Lília Gondim
Limitaram teu corpo com cal e pedra,
quando ainda do teu seio brotava infância,
mas não te destruíram. E no espaço, além,
pelo fio das horas tu tecias
tua imagem, mais que verde, de esperança.
Esta imagem de mansinho se espalhou,
mais forte e mais bela no meu sangue,
e nas tarde de outono, com teu nome,
distraía a primavera quase exangue.
Não se rendam jamais à pedra e à cal,
que argamassa se faz, cumprindo horrores.
Cantemos o outono e a primavera,
que são feitos de cantos e de amores.
Vês que num peito, às vezes, comprimido,
entre algozes e angústias brotam flores.
Recife-PE, 1970
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